quarta-feira, 13 de maio de 2009

O bandido de 13 anos e cara de anjo que aterrorizava a Amadora

Em muitas paredes degradadas do Bairro 6 de Maio lê-se o mesmo nome: Jizoni. É a alcunha de um rapaz de 13 anos nascido em França. Com menos de um ano foi com a mãe, cabo-verdiana, para a Damaia de Cima, no concelho da Amadora, às portas de Lisboa. Pequeno, de olhar vivo e palavra fácil, apresentou-se no Tribunal de Família e Menores de Lisboa com ar de menino inocente. "Mas não nos podemos esquecer que estamos perante um pequeno marginal", adverte o juiz do Tribunal de Família e Menores de Lisboa, que condenou Jizoni a três anos de internamento no centro educativo de reinserção social de menores do Mondego, perto da Guarda.Se fosse no Brasil, Jizoni seria o "terror da cercania". Conhecem-no bem de mais, os vizinhos da Damaia, que se dividem entre as críticas às autoridades e a compaixão pela mãe do rapaz, que trabalha de manhã à noite nas limpezas. Desde muito cedo começou a roubar - então ainda sem a violência que hoje enche as páginas dos processos que lhe dizem respeito. Assaltos à mão armada, carjaking e violência desproporcionada. De uns crimes é suspeito, de outros autor confesso. Desesperada, a mãe, Ana (nome fictício), de 41 anos, chegou a mandá-lo para junto da família, em Cabo Verde, em Junho de 2007. Mas não resultou. Só o aguentaram um ano: "Portava-se mal..." Uma maneira de dizer. O filho tinha apenas 11 anos - pouco mais que uma criança -, quando começou verdadeiramente a "carreira" de delinquente. Foi detido repetidamente por pequenos furtos, por um roubo de telemóvel e vários por esticão. Passava de bicicleta pelas mulheres e levava-lhes a carteira, sem olhar para trás. Entre os 11 e os 12 anos, Jizoni entra e sai de centros educativos em São Domingos de Benfica e Oeiras - é aí que conhece outros jovens delinquentes. Faz novos amigos. Começa a participar em festas de música africana e hip-hop nos bairros 6 de Maio e na Cova da Moura (perto de casa). Numa dessas noites é apresentado a um grupo de rapazes mais velhos, que se tornam seus companheiros e com quem começa a combinar assaltos. As companhias passam a ser a desculpa recorrente do jovem para acalmar os ânimos da mãe, constantemente chamada às esquadras e ao tribunal. "Quando lhe perguntava porque fazia aquilo, dizia que os amigos mais velhos o levavam e ameaçavam fazer-lhe mal se não participasse nos assaltos." Ana quase perdeu a esperança e quando lhe telefonavam a meio da noite da esquadra da Amadora para ir buscar o filho chegou a recusar fazê-lo. "O que eu queria é que ele ficasse internado num colégio", suspira. Mas, porque não tinha idade - só podem ser internados nesse regime jovens com mais de 12 anos - ou porque fugia dos centros, Jizoni ia sempre parar aos locais que conhecia bem: a Damaia, a Cova da Moura, o Bairro 6 de Maio. Foi aí, entre aglomerados de casas clandestinas ligadas por passagens estreitas, que combinou com quatro amigos o roubo ao restaurante Happy Grill do Cacém (Sintra) e a uma churrasqueira em Santa Maria da Azóia (Vila Franca de Xira) em Fevereiro deste ano. Logo de manhã roubaram um Volkswagen Golf na linha de Sintra, obrigando o condutor a sair do carro apontando-lhe uma arma à cabeça. Depois do carjaking o grupo manteve-se calmo, para não chamar as atenções. Já passava das 21h30 quando os jovens estacionaram à porta do restaurante, no Cacém. Um esperou na rua, com o carro a trabalhar, os outros entraram encapuzados e apontaram a caçadeira à cabeça da funcionária. Só que a empregada teve o azar de demorar a abrir a caixa e os rapazes não estiveram pelos ajustes: levaram-na. Do Cacém seguiram para Santa Iria da Azóia e às 22h00 assaltaram outro restaurante, levando, mais uma vez, a caixa registadora. Meia hora mais tarde, a PSP mandou-os parar em Barcarena, mas o condutor fez inversão de marcha, quase atropelou os dois agentes, e fugiu. Pouco depois chocaram com outro carro, o que pôs fim à perseguição. A empregada foi libertada, os cinco jovens, com 13, 17 e 20 anos, acabaram presos. Jizoni foi entregue à mãe e os companheiros ficaram em prisão preventiva.Quase todos os polícias conhecem Jizoni: os da PSP da Amadora, os agentes da Judiciária, os do SEF. E todos têm a mesma opinião: "É um miúdo simpático, que lembra as figuras dos quadros renascentistas com anjos, algo falador e até respeitador." Não percebem porque é que, sobretudo a partir do Verão de 2008, mergulhou numa onda de crime, imparável e cada vez mais violento. Todas as vezes que esteve nas esquadras da Amadora e de Lisboa e no Governo Civil, foi educado e quase sempre confessou os crimes, diz quem o interrogou. Talvez por saber que em poucas horas estaria na rua outra vez - já que é menor. Numa das situações mais graves, depois de o filho e dois amigos assaltarem a sua própria casa - "Fiz queixa, pois então", atira Ana -, a mãe recusou-se a ir buscá-lo e Jizoni teve de passar uma noite nos calabouços. No dia seguinte foi presente ao juiz, que determinou o seu internamento. Ana esteve no tribunal e só pediu que ele fosse para longe: "Onde pudesse estar arredado das más companhias". Resta-lhe a esperança de uma reabilitação muitas vezes adiada.

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